segunda-feira, 12 de maio de 2014

Os argumentos contra as "barrigas de aluguer"


 

1 – Barriga de aluguer é a expressão corrente que identifica com precisão o que por vezes também se designa por “maternidade de substituição” (como faz a lei portuguesa) mas que em nosso entender não diz com clareza do que se trata.

2 – Trata-se na verdade de um processo de reprodução artificial em que uma mulher cede o seu útero para que nele seja implantado um óvulo já fecundado, comprometendo-se a gerar uma criança e a entregá-la no final da gestação, à dadora do óvulo ou a uma terceira pessoa que lhe encomenda tal gestação. Independentemente de haver ou não dinheiro envolvido neste processo o certo é que se trata de um contrato com direitos e encargos para ambas as partes. Por isso estamos perante um verdadeiro negócio, cujo objecto é uma criança.

3 – A literatura e o cinema estão cheios de “casos” que mostram a dramaticidade resultante de tais negócios. Mas não é só ficção. Países como os Estado Unidos da América têm já vastos e complexos casos judiciais trazidos a público, onde mães (de aluguer) na hora do parto dizem – este filho é meu – e não o entrego…; casais que confiantes em contratos muito bem elaborados por advogados, pagos a peso de ouro, se vêem chantageados no final para que lhes seja entregue aquela criança onde tanta esperança depositaram; ou nascendo a criança com alguma doença ou malformação é rejeitada pelo casal, que não a reconhece como sendo “a encomendada”. Acrescem os relatos de mulheres que, por dificuldades económicas, vêem na “barriga de aluguer” uma fonte de receita – quase como uma profissão – obtida com o aluguer do seu útero. Muitos são os casos, e outros que a imaginação pode intuir.

4 – Se há uns anos atrás a expressão remetia para uma prática desumana e contra-natura a que a larga maioria da população se opunha, hoje a sensibilidade comum parece estar a mudar. Para isso, foi feito, tal como nas outras matérias da Bioética (aborto, eutanásia, etc.), um caminho que se pauta, como sempre, por clássicas abordagens. Assim,

a) Começa por só se admitir nos casos extremos, de grande necessidade e raros. Um exemplo – só se admite se for para um casal cuja mulher teve um cancro no útero e por isso pede à irmã que a ajude... Como se uma lei fosse feita para os casos particulares, particularíssimos…

b) Depois, diz-se que ainda que moralmente censurável, ninguém é obrigado a recorrer a esta técnica….

c) Em terceiro lugar destina-se “sempre” a pessoas muito infelizes que precisam do nosso apoio e compreensão…

d) Em último lugar, “já se faz” porque não legalizar…

5 – Isto é, a abordagem nunca se faz pela essência da questão ética e ontológica mas por particulares muito particulares que ofuscam a questão.

Ora, o que está em questão na barriga de aluguer quanto a nós, são três dimensões que importa reflectir:

 - Em primeiro lugar estamos a falar da gestação de um ser humano que tem direito a uma identidade genética (no sentido mais amplo e que recebe, por um lado os genes de duas pessoas e por outro a nutrição e comunicação vital intra-uterina (com consequências psíquicas) de uma outra pessoa, a mãe de substituição (quando a medicina hoje identifica como sendo de fundamental importância a transmissão de afectos, vivências, conhecimento e doenças, etc. nesta relação intra-uterina).

 - Em segundo lugar, num tempo em que tanto se fala de Direitos da Mulher, de Dignidade da Mulher, perguntamo-nos porque se admite na lei, que uma mulher passe 9 meses a gerar uma criança, criando laços de afecto (corpo do meu corpo) e vivências, e no final lhe seja arrancado esse filho.

 - Em terceiro lugar pensamos no adolescente que não sendo gerado pela mãe com quem vive, nem resulta do óvulo desta, vem a saber que geneticamente é filho de outra mulher (é filho de três mulheres – a que deu o óvulo, a que o gerou e a que socialmente é tida por mãe)… que questões de identidade se lhe colocam? Tem direito a conhecer as doenças hereditárias transmissíveis que aquela mãe genética tinha?

(…)

Oxalá o legislador saiba qual a função da lei. Basta de leis que não respeitando a natureza humana tornam cada vez mais o homem escravo de si próprio, das ideologias e em última instância escravo do Poder.

 

 

 

Isilda Pegado

Presidente Federação Portuguesa pela Vida

 

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